28 de Abril de 2024

“Eles querem amedrontar o brasileiro”, afirma avó condenada a 14 anos por Moraes

“Ele tem feito isso conosco para que as pessoas fiquem com medo”. É o que afirma Rosana Maciel Gomes, 50, presa dentro do Palácio do Planalto durante os atos do 8 de janeiro, ao comentar as últimas decisões do ministro Alexandre de Moraes. No seu caso, Moraes a condenou a 14 anos de reclusão. O julgamento, que está plenário virtual do STF, começou na última sexta-feira (27). O prazo para que os outros ministros que compõem a Corte se manifestem vai até a próxima terça-feira (7).

Rosana sabe que pode voltar a ser presa e entende que seu julgamento está sendo usado como instrumento de censura prévia, para inibir qualquer manifestação contra autoridades. Ao lembrar do 8 de janeiro, diz que não consentiu com as ações de vandalismo e que só entrou no Planalto para se proteger das bombas de gás lacrimogêneo.

“Eu não acredito nessa condenação [na legalidade]. Eles estão seguindo o trâmite para amedrontar o brasileiro. Para que o brasileiro não venha se manifestar de novo”, reforça.

Rosana ficou sete meses no penitenciária feminina de Brasília, a Colmeia. Durante o tempo que permaneceu presa não teve contato com os quatro netos, que começaram a desconfiar que ela tinha morrido. “Eles pediam para ligar para mim e o meu celular estava desligado. Aí eles perguntavam para o pai deles: ‘por que minha vó não me atende? Ela virou estrelinha?’”, relata.

O neto mais velho, de 7 anos, foi encaminhado ao hospital depois de passar mal ao saber da pena de 14 anos da avó. Os médicos acreditam que ele teve uma arritmia cardíaca. Agora, o garoto, que já fazia tratamento com psiquiatra, também está sendo acompanhado por um cardiologista. “Ele é o mais apegado comigo, é o primeiro neto. Tanto que agora ele dorme na cama comigo e não aceita dormir com ninguém. Ele tem muito medo de eu sair e não voltar”, comenta.

Rosana saiu da Colmeia com 35 quilos a menos, depressiva e sem emprego. “A minha alimentação era água e bolacha de água e sal”, conta. Agora trabalha como motorista de aplicativo para sustentar a casa. Ela mora com duas filhas e dois netos, que ajuda a criar. Além deles, a mãe e o tio de Rosana, já idosos, contam com os cuidados dela para resolver desde pendências bancárias a compras de supermercado. “Eles dependem de mim, durante esses sete meses, eles ficaram privados de muita coisa”, explica.

“Fugir do que, se eu não tinha quebrado nada?”

No dia 6 de janeiro, Rosana saiu de Goiânia, cidade em que mora, e veio a Brasília no próprio carro com outras duas pessoas. No tempo que esteve na capital, dormia na casa de um dos filhos e passava o dia no acampamento em frente ao Quartel-General. Da mesma forma como relatam outros réus do 8 de janeiro, Rosana conta que não havia um horário definido para começar a manifestação e que logo após o almoço as pessoas começaram a descer em direção a Esplanada dos Ministérios.

Já na Esplanada, viu manifestantes depredando o Palácio do Planalto. Ela estava junto de um grupo de seis idosas – que também foram presas – e se esconderam embaixo de uma árvore. Na tentativa de ir embora, bombas de gás lacrimogênio foram jogadas na direção do grupo de senhoras que se refugiou no Palácio do Planalto. “Não tinha para onde correr mais, porque havia uma multidão”, narra Rosana.

Ao entrar no prédio, encontraram o espaço bem deteriorado. Ao mesmo tempo que viu pessoas quebrando e gritando, encontrou outras que estavam passando mal ou feridas. “Qual foi a nossa intenção? Ajudar as pessoas que estavam ali dentro passando mal, até crianças. A gente não pensou em sair, mas em ajudar as pessoas que estavam ali dentro. Logo em seguida, o Exército entrou e fez uma barreira. Foi aí que a gente resolveu ajoelhar e orar para eles intervirem”, descreve. Do lado de fora, a polícia jogava bombas de gás lacrimogêneo na tentativa de acuar os manifestantes.

“Não veio na minha mente a ideia de fugir. Fugir do que, se eu não tinha quebrado nada? Eu estava ali dentro para me proteger”, conta Rosana. Ela ainda explica que cooperou com a polícia desde o primeiro momento porque não tinha nada a esconder. “Eu entreguei meu celular e dei a senha do meu celular. Eu ainda desenhei. Eu fiz as bolinhas e desenhei qual que era a senha. Se eu tivesse devendo alguma coisa, eu ia dar a minha senha?”, questiona.

Segundo major, manifestantes ajudaram a conter vândalos

Hélio Junior, advogado de defesa de Rosana, alegou em sustentação oral anexada ao processo que não houve uma única conduta criminosa apontada contra a ré, apenas a menção, sem provas, de que ela teria contribuído de alguma forma com com crimes multitudinários. O crime de multidões é quando a conduta individual do réu não é considerada, pois julga-se que há influência entre os criminosos ao haver um objetivo em comum.

O advogado utiliza imagens das câmeras de segurança para comprovar a fala. Em um dos trechos apresentados na sustentação oral, um rapaz derruba o relógio de Dom João VI, enquanto chega um outro grupo que o coloca no lugar. O mesmo relógio é derrubado mais uma vez por um outro vândalo, mas novamente tentam colocá-lo de volta, mesmo com o objeto já despedaçado.

Parte do depoimento do major José Eduardo Natale também é utilizada na sustentação oral. Ao ser questionado se havia uma atitude homogênea dos manifestantes, ele relata que não havia coordenação entre as pessoas. “Não, eram atitudes diversas. Nem grupos se pode dizer, porque as pessoas estavam bem descoordenadas ali dentro. Até as pessoas que falavam a mesma coisa, não havia uma união de pensamento ou coordenação entre elas. Então, era bastante heterogêneo o grupo, sim”. O major ainda complementa informando que apenas uma minoria se empenhava em depredar o local e que recebeu auxílio de manifestantes para conter os vândalos.

Insegurança para o futuro

Acompanhada por um psiquiatra e tomando medicação para conseguir enfrentar as dificuldades, Rosana ainda está tentando superar tudo o que viveu enquanto estava presa. “Eu não consigo dormir. Um trauma que eu tenho é de ouvir o barulho de grades abrindo ou gritos. Isso ainda está muito forte na minha mente”, descreve. Ela ainda acrescenta que “foi doloroso, foi difícil, mas Deus nos sustentou todas lá o tempo todo”.

Até o fechamento desta reportagem, apenas o ministro Cristiano Zanin publicou seu voto em relação ao caso de Rosana. Zanin acompanhou a decisão de Moraes com ressalvas. Para Zanin, a ré cometeu todos os crimes apontados por Moraes, mas ele diverge da pena, acreditando que Rosana deveria ser condenada a 11 anos de reclusão.

“A pena de 14 anos é desproporcional para qualquer pessoa sendo que não existem comprovações nos autos que concorreu com os atos de vandalismo, isso pode ter um impacto devastador em sua vida. Ela pode perder sua liberdade, sua reputação e seu sustento”, declara Hélio Junior, advogado de Rosana.

 

Informações da Gazeta do Povo / Foto: Divulgação

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